Coluna Histórias & Estórias – Por Chico Lelis:
Vocês devem achar que eu enlouqueci neste outono. “Tô” louco não!!! Vou provar, por intermédio desta “estória” porque, conforme uma sugestão do meu amigo Ricardo Hernandes.
O cara do Uber, passava o dia inteiro ouvindo ordens de uma mulher. – “Vira pra cá, vira pra lá, siga em frente, dobre à esquerda na rotatória, buraco e radar relatados à frente, acidente na pista; rodar em frente”. E sempre ela, falando com aquela voz que nem sempre acertava o nome da rua ou avenida, mas o ajudava a andar por lugares nunca dantes navegados. (Em São Paulo, por exemplo, ela fala avenida Giovanni “Gronxi”, e não “Gronqui”, como é a certa pronúncia italiana).
Então, ele conhecia a cidade, novas pessoas, ouvia casos, assistia a acidentes ouvia lamentos e confissões, o silêncio dos seres mal-humorados ou tímidos; ida da Penha à Lapa, de Copacabana ao Grajaú, do Farol da Barra a Itapuã, do Centro à Savassi, dependendo da cidade em que trabalhava. Era duro trabalhar 10, 12 ou mais horas por dia, mas levava uma graninha pra casa, nestes tempos difíceis de desemprego.
Tudo mudou, menos a mulher mandando
Mas, de uma hora pra outra, como em um filme de ficção científica, o mundo parou. Poucos saem mais às ruas, não há mais passageiros para levar daqui pra lá e de lá pra cá. Não tem mais histórias ou estórias para ouvir, seguir por esta ou aquela via, dobrar à direita ou à esquerda. Nada de descobrir lugares novos. O seu 208 está mais parado que andando, para levar ou trazer passageiros. Tudo acabou, inclusive aquelas ordens virtuais.
Mas chegou a hora da verdade, da voz presencial, real a da mulher: varre a sala, lava a louça, troque a roupa de cama das crianças e põe pra lavar. Já colocou a ração do cachorro e a do gato? Limpou a gaiola dos passarinhos? Levou o lixo pra fora? Cuidado, quando voltar deixe os sapatos do lado de fora, lave as mãos e passe álcool gel antes de tocar nas coisas ou encostar nas crianças, que estão jogando videogame no quarto delas.
Viram? Não tinha eu razão quando afirmei lá no título, que até no Uber quem manda é a mulher?
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