Motociclismo perde Noel
Não dá para negar que Noel, como era mais conhecido, tinha duas paixões: a mecânica de motos e carros misturada com velocidade e, a vaidade, pois, nunca se separava do pente, levado no bolso traseiro da calça, de onde constantemente o tirava para assentar os cabelos, a “lá galã de Hollywood”. Nascido em 10 de outubro de 1938, em Curitiba, Noel residiu na casa de seus pais, na Rua Castro Alves, bairro Batel, até 1966, tendo cursado o primário na escola particular de Maria da Luz Seiler Veiga (Dona Lulu) e, o ginásio no Colégio Estadual do Paraná. Aos 14 anos de idade viu nascer sua paixão pelos motores sobre duas rodas. O primeiroveículomotorizado que pilotou foi uma bicicleta Raleigh (inglesa) com motor Victória (alemão), duas marchas. No tempo em que não havia estrada asfaltada já ia com essa bicicleta à praia de Guaratuba, no que gastava oito horas de penosa viagem ou, à Piraquara, desta feita rebocando seu amigo e vizinho José Carlos Misurelli, este em outra bicicleta sem motor.
Foi o perseguido jogo do bicho que proporcionou a Noel o dinheiro para comprar, nas então “Lojas Famosas” Hermes Macedo, em 1954\55, uma Taxi Mondial, bicicleta com motor de cerca de 1,5 cavalos embutido na roda traseira e que era a coqueluche da época. Até os 17\18 anos de idade Noel curtiu a “velocidade” das bicicletas motorizadas, que existiam às pencas na cidade. Em 1957 Noel foi, como voluntário, servir o Exército Brasileiro, tendo sido paraquedista do Núcleo da Divisão Aeroterrestre, no Rio de Janeiro, completando 48 saltos. Em 1958, já de volta a Curitiba, começou sua verdadeira trajetória como piloto de motocicletas, muito bem incentivado pelo primo Roberto Sérgio Guimarães, que possuía uma lambreta 1956 Standart. Já com esta motoneta, de 150cc e pouco mais de 6 cavalos, Noel começou a se interessar pelas corridas e fez sua estréia numa prova promovida pela firma Hermes Macedo, no quarteirão do Mercado Municipal. O trajeto tinha saída em frente ao mercado, descendo pela avenidaSete de Setembro, fazendo o cotovelo e entrando na avenida Afonso Camargo, subindo por esta e pegando a Rua da Paz para entrar na Sete de Setembro de novo. Com saudade daqueles tempos heroicos das lambretas, Noel relata sua primeira corrida: “Quem preparou o motor da lambreta foi Giovani Sgro, o “cobra” no assunto, uma semana antes, quando ele tinha oficina mecânica na rua Brigadeiro Franco. A corrida me deixava apreensivo, pois, estava presente gente de renome nacional, da equipe Jodora, de São Paulo, inclusive o ex-campeão italiano Aventino Gallone, além do famoso Jacaré, Durão e outros. Havia 12 competidores no total, sendo 8 de Curitiba, entre estes o próprio Giovani Sgro, Sgarbie outros. As máquinas de São Paulo, melhor preparadas e carenadas, deveriam ganhar e eu tinha que tentar tirar vantagem nas curvas. Graças a essa estratégia, levei três belos tombos, mas, consegui chegar em quarto lugar e ganhar o primeiro prêmio da minha vida em corridas, um liquidificador, dado pelo Hermes Macedo. Quem venceu a prova, é claro, foi AventinoGallone e, como prêmio, recebeu uma lambreta.”
Noel competiu e ralou seu corpo no asfalto das pistas até 1965. Suas mãos habilidosas pilotaram desde bicicletas motorizadas até lambretas, vespas, Zundapp 600cc, Moto Guzzi 500cc, BSA Gold Star 500cc, TWN, Jawa, Ogar 350cc, Indian TT 350cc, motocicletas de cross e outras. Quase uma vida inteira sobre duas rodas e muitas “loucuras”. Entre seus tombos mais marcantes está um com uma motocicleta Triumph Tiger 500cc 1963, na rua Carlos Cavalcanti, quando ralou o asfalto por cerca de 100 metros, quebrou um braço, perdeu o terno e ficou praticamente de cueca; outro, de lambreta, no início da avenida Luiz Xavier, em frente às lojas Stier, indo parar no Braz Hotel, quebrando o pé, no qual jogou cachaça comprada no Bar Triangulo (Cachorro Quente) e indo ao médico só no dia seguinte; mais outro, com BSA 350cc, na Serra da Graciosa, com Danilo Afornalli na garupa, quebrou o pé e ficou dois dias na praia sem poder tirar a bota, devido ao inchaço. Mas, um dos piores e mais recentes, com uma moto-cross 350cc, foi na rua Dr. Pedrosa, em pleno domingo, sem capacete, que era a sua característica. Ao ultrapassar um motociclista mais lerdo, foi atrapalhado, esbarrou neste, perdeu o equilíbrio e entrou com a cross motor de 350cc da “Viúva Negra”, preparada pelo piloto Ubiratan Rios, por baixo da traseira de um Chevrolet Opala estacionado. Simplesmente abriu a cabeça, quase perdeu uma orelha,caíram os supercílios e teve ferimentos por todo o corpo, ficando 5 horas hospitalizado, para ser devidamente “recauchutado” pelo médico.”
O texto acima, reproduzido, faz parte de uma grande reportagem feita por este jornalista e publicada no Jornal do Batel em julho de 1996, abordando aspectos da vida do amigo e motociclista apaixonado Manoel Alencar Guimarães Júnior, o Noel, falecido a primeiro de setembro de 2012. Sem dúvida Noel, que não só participou mas ajudou a organizar muitas corridas também, tem lugar de destaque entre aqueles motociclistas que muito contribuíram, em épocas de pioneirismo, ao desenvolvimento do motociclismo de competição como esporte, tanto em Curitiba quanto no Paraná e no Brasil. Nas fotos, Noel participando de corridas.